sexta-feira, 5 de julho de 2013

Qualquer poesia pode ser prosa...

 Lindos olhos tem Silvina, lindas mãos Silvina tem, e a cintura de Silvina é fina como o azevém. Em Silvina tudo exala um cheiro de coisa fina, mas o que a nada se iguala é a fala de Silvina. A doce voz de Silvina é como um colchão de penas, é um fio de glicerina, um vapor de águas serenas.

― Porque não cantas, Silvina? Se a tua voz é tão doce, talvez cantada que fosse mais doce que a glicerina. Porque não cantas, Silvina?

― Não me apetece cantar, e muito menos para ti, eu sou nova, tu és velho, já não és homem para mim.

― Não me tentes, Silvininha, que eu já não te olho a direito, sou como um ladrão escondido na azinhaga do teu peito.

― A azinhaga do meu peito corre entre duas colinas, o ladrão do meu amor tem pé leve e pernas finas.

― Canta, canta, Silvininha, uma canção só para mim. Dar-te-ei um lençol de estrelas, uma enxerga de alecrim.

― Deixa o teu corpo estendido à terra que o há-de comer. A tua cama é de pinho, teus lençóis de entristecer.

― Canta, canta, Silvininha, como se fosse para mim. Dar-te-ei um escorpião de oiro com um aguilhão de marfim.

― Não quero o teu escorpião, nem de ouro nem de prata. Quero o meu amor trigueiro que é firme, e não se desata.

― Pois não cantes, Silvininha, se é essa a tua vontade. Canto eu, mesmo assim velho, que o cantar não tem idade. Hás-de tu ser morta e fria, cem anos se passarão, já de ti ninguém se lembra, nem de quem te pôs a mão. Mas sempre há-de haver quem cante os versos desta canção: 

- Ai Silvina, ai Silvininha, amor do meu coração....

(António Gedeão)

Sem comentários: