quinta-feira, 20 de março de 2014

Ninguém as fez, ninguém as fez, mas elas existem!... (1)


"A falácia do aumento da dívida pública

Opinião de Carlos Guimarães Pinto

 Uma das 3 pessoas que faz o sacrifício de ouvir o comentário de Sócrates aos Domingos na RTP, tratou de informar as redes sociais que o antigo primeiro-ministro se queixou ontem do aumento da dívida pública nos anos do governo PSD-CDS. Os números, de facto, não enganam, como podem ver no gráfico abaixo:

A tendência desde o último ano completo de governação Sócrates (2011) é de facto assustadora: subiu 53 mil milhões de euros, qualquer coisa como 35% do PIB em apenas 3 anos. Excepcionalmente, Sócrates diz a verdade. Se quisesse levar a retórica mais longe, até poderia dizer que, se acumulou tanta dívida pública, desde que ele deixou o governo, como no total dos seus mandatos.
Claro que é de esperar que a dívida suba enquanto existirem défices públicos. Comentadores como José Sócrates que defendem metas mais flexíveis para o défice, dificilmente, se poderão queixar que a dívida pública aumenta. Não podem defender ao mesmo tempo que haja défices mais altos, e depois, criticar que a dívida pública resultante desses défices aumente.
 A dívida pública é isso mesmo: o resultado da acumulação de défices. Mas será mesmo assim? Para analisar a veracidade desta relação económica, podemos observar abaixo a evolução do défice das contas pública e o crescimento da dívida pública.
A relação efectivamente mantém-se. Na maior parte dos anos a dívida pública aumenta no mesmo montante do défice público, com umas pequenas diferenças, os chamados ajustamentos défice-dívida. Estes ajustamentos são quase sempre bastante pequenos, mas há uma notável excepção: os anos imediatamente a seguir à saída de Sócrates!

Nesses anos, a dívida pública aumentou bastante mais do que o défice das contas pública levaria a pensar. E porquê?

Isto deveu-se a 3 factores:

1 - O salvamento dos bancos. Algo que qualquer governo no actual panorama partidário teria feito. A alternativa a esta medida seria os depositantes de alguns bancos menos sólidos (BCP, BANIF,…) terem ficado sem parte dos seus depósitos, como em Chipre.

2 - A variação nas reservas de segurança do estado. Parte da dívida contraída refere-se a um aumento de reservas do Estado, ou seja dinheiro não alocado a despesa que fica em depósitos garantindo uma almofada caso falhe crédito. Foi esta a almofada que faltou em Maio de 2011 e que empurrou Sócrates para o pedido de ajuda antes das eleições, sob o risco de o país falhar o pagamento de salários e pensões nos meses seguintes.

3 - O pagamento das dívidas a fornecedores. Como a dívida a fornecedores não entra para os cálculo de dívida pública, uma forma fácil de um governo esconder a dívida pública é faltando, ou atrasando, o pagamento aos seus fornecedores. Esta dívida era bastante elevada quando Sócrates deixou o governo, particularmente na saúde. O pagamento dessa dívida pelo actual governo também contribuiu para um aumento da dívida pública.

Ou seja, grande parte da dívida pública foi para salvar um sistema bancário deixado de rastos pelas políticas económicas, para repor as reservas de dinheiro que o governo Sócrates depletou até não haver suficiente para pagar salários e reformas, e para pagar os calotes deixados por esse mesmo governo, nomeadamente no sector da saúde.

Podemos ainda apontar o facto de uma parte do défice actual se dever aos pagamentos das PPPs assinadas por Sócrates, outra forma de disfarçar dívida e défices passados. Antes das PPPs, um governo que construísse uma auto-estrada teria que contar com essa despesa no orçamento do ano em que a auto-estrada fosse construída, aumentando o défice. Utilizando uma PPP, um governo pode construir uma auto-estrada sem qualquer impacto no défice, empurrando esse custo e respectivos juros para os governos seguintes.

Sócrates tem razão quando diz que a dívida subiu bastante imediatamente após a sua saída do governo. Mas não deve esquecer que esta é, maioritariamente, a sua dívida.


A dívida que Sócrates escondeu através das PPPs, dos calotes a fornecedores, do esvaziamento das reservas de segurança do estado que quase deixou o país sem capacidade de pagar salários e pensões, e do caos em que as políticas do seu governo deixaram o sistema bancário."


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